25 novembro 2009

Devaneio

Grito em silêncio pra você me ouvir
Te encaro no escuro pra te afrontar
Fecho meus olhos pra você sumir
Te faço sorrir para me curar


Mergulho em teus beijos para me afogar
Afogo-me em teus braços pra me confortar
Teus olhos revelam a perfeição
Não é obsessão
Tu és espelho, espelho meu.


Meu coração de repente dispara
Meus olhos se abrem e sinto o frio
As dores e imundices revelam a embriaguez
Desaponto-me ao perceber
Que sonhei contigo outra vez


Te amei sem te ver, nem conhecer, nem te beijar.
Te amei por sonhar.
Morro para viver, morro para amar.
Vivo para morrer, vivo por não saber amar.


Devaneios me levam a constante confusão
A confusão me leva à inconstância
O vento passa e leva minhas roupas
O tempo passa e leva minhas forças


Nessa varanda fria e monótona
Contento-me com a clausura
Tenho medo de sair e te encontrar
E me derramar por não poder te abraçar


Se for você meu esperado
Que seja a tua eu
E no tempo que nos resta
Não me machuque amado meu

05 novembro 2009

Verão

Eles chegaram. Júbilo. Esperei tanto por isso. Vou abrir a porta.
Luiza!! Felipe!! Bem-vindos foram. Um diálogo me marcou:

 -Estam vendo estes quartos? Estam tomados por visitas indesejadas, me fazem muito mal. Sabe o que eles fazem comigo? Logo de manhã amarram uma corda em meu coração, atam-na e pressionam-me até que eu fique exausta, algumas vezes não aguento e passo pela vergonha de me expor, assim, nua de minha integridade. - eu disse.
 -E eles têm nome? -indagou Felipe.
 -Existem muitos deles, boa parte não sei como se chamam, alguns nem entendo a pronúncia, mas sinto ferirem-me. Sei que há a Rejeição, o Rancor, a Humilhação, a Solidão, e o líder deles é a Tristeza. Prefiro nem pensar neles, já aparecem demais pra mim.Adoraria que saissem de minha casa, cansei.
 - Por que não faz o que estamos fazendo? -sugere Luiza- Fuja, venha! Deixe esse lugar.
 - Temo pela verdade. Sei muito bem que se eu sair, nada disso vai passar, só mudarei o cenário. Além disso, não posso deixar essa casa, disseram que tenho que lidar bem com as visitas e daqui a alguns anos eu poderei sair, entretanto não terei a garantia de sentir-me livre, como anseio. Se eu sair, virão mais hóspedes... - lamentei.

Rimos muito, inocentemente, abundantemente. Poucas vezes pude me sentir tão viva e certamente eufórica. Eram meus amigos, no sentido mais verdadeiro da palavra. Mas a pior parte chegou, inesperadamente: A partida.

 -Temos que ir embora. -exclamou Felipe, fazendo as malas rapidamente e retirando todos os doces que estavam sobre a mesa. - Não temos culpa, você sabe.
 - Mas vocês trouxeram-me a vida que havia se escondido de mim, e é muito difícil encontrá-la sozinha. Não me deixem. -Exprimi doridamente.
 - Adorariamos continuar por aqui, Natália, mas o vento nos leva e não podemos ficar. Sinto muito. - Luiza abandonou minhas mãos.
 -Não! -bradei na vã esperança de convencê-los a não me deixarem.
 -Adeus... -disseram juntamente.
Não houve tempo para abraços, despedidas, considerações. Queria agradecê-los por trazer aquela inexplicável alegria. Se foram, como sempre. De repente desapareceram. Me restou ficar novamente com todos aqueles invasores que viviam comigo.
E o doce se tornou amargo mais uma vez.

Não é só Luiza que quer fugir

(Essa carta é real e foi postada com a permissão do autor, meu amigo)
O Felipe me mandou uma carta, parece que nós estamos com o mesmo problema. A Luiza e Ele virão aqui no próximo verão. Espero suas visitas. Saudade

Precisamos, logo, ir embora....
Este lugar simplesmente está nos corroendo.
Quando penso que tudo será diferente, vejo que é apenas outro fantoche, com suas promessas, e, no fim, apenas me destrói lentamente.
Quantos já passaram por mim?
Poderia citar todos, cheguei a amar, e então... Apenas morrer mais um pouco.
Nada está certo, não quando o melhor abraço que recebo está num sonho... Não quando o único amor verdadeiro está num distante passado.


O que é isso?
O que podemos fazer...?
Quando vamos embora?
                                    
                                                                                                                                                                                         

04 novembro 2009

Outra carta de Luiza

  Viro, reviro ao avesso, contexto. Não me encaixo nem acho roupa que caiba em mim. Por quê?
  Futuro te espero. Ora me desespero, ora acalmo-me, mas não deixo de te esperar como te quero.
  Não quero ninguém aqui, seria difícil alguém acompanhar as rachuras e fragmentações de minha alma. não tenho casa, não tenho nada. Quero muito, talvez demais.
  Atos ocultos, cobranças inexoráveis. Tudo a minha volta está escuro e frio, como numa erma cidadela, nevada, cinzenta. Por vezes, minha visão turva impede-me de ver o sentido das sangrentas batalhas diárias. Não conheço minha força, mas conheço minha vontade. Vivo no patriotismo do meu próprio país, este que criei dentro de mim.
  É cabível afirmar o que já foi dito: "Melhor só do que mal acompanhado". Concordo.
  Amo minha vida, mas detesto a forma como tenho vivido. Creio em mim, sou meu deus. O narcisismo é meu melhor amigo. E que se exploda o mundo.

A carta dela pra mim

  Essa cidade escura, primitiva e interiorana não me convence, não me satisfaz. Falo sério, ninguém por aqui tem algo a ver comigo, se ao menos eu pudesse sair, sumir, fugir. Mas eu não posso pegar minhas malas e viajar para bem longe como em meus sonhos. As pessoas daqui são amargas, se fazem juízas sem pudor e dão uns aos outros a sentença que lhes parece justa (sempre injusta). Provavelmente cometi um crime tenebroso ou pejorativo contra a sociedade, do qual não tenho conhecimento algum. Vivo na realidade da falta de verdade destes leigos civis. Realidade que por certo viveria, porém a vida escolheu estes joviais anos para meu sofrimento.
  Época, lugar, pessoas: combinação cruel que entra em colapso em meu fraco coração. Nessa dita escola da vida, a Tristeza é minha professora e as decepções, minhas lições de casa. E sou uma ótima aluna.
  Só não me subtraio, nem me rebaixo. O bom senso me ensinou a manter meus olhos no fim do horizonte e longes do chão. Não preciso ser explícita, não vou mostrar, nem me rebelar, isso é só meu. Sorrio.
E ainda saio daqui.

03 novembro 2009

Cidade Pequena

Luiza não aguenta assistir ao mesmo filme todos os dias. O que antes não importava agora a tortura sem tréguas, seu suplícios pela fuga de nada adiantam. Ela sabe que tudo seria diferente se estivesse fora dali, se estivesse bem longe. Não é agradável viver em uma cidade pequena quando se pensa grande, nisso eu devo concordar com ela. Seus sonhos vão mais alto que seus pés podem chegar, não por serem mirabolântes, mas por seu passado a impedir de sentir-se livre. Ela errou muito, muitas pessoas a feriram, muitos lugares foram marcados por seus pecados. E é isso que tanto a sufoca, é ser obrigada a ver as mesmas pessoas todos os dias, passar pelos mesmos lugares e inevitávelmente sentir-se suja por tanto lembrar do que foi feito.
Ela quer muito não se importar, parar de ser destruída pelo silêncio turbulento de suas lembranças. Mas não há como esquecer, é impossível não se sentir reprimida dessa forma. Agora suas lágrimas cessaram, ela está perfeitamente acostumada a lidar com a solidão e a saudade das raríssimas pessoas que a fizeram sentir-se próxima do que dizem ser amor. Acho que ela ama sem saber, ela diz não saber amar. Agora lhe restou a companhia fiel de seus livros e cálculos, assim ela tem a garantia de um dia sair muito bem dali.